Mais Ainda - Ressonâncias da escrita no sujeito da psicanálise

07/10/2020

Georges Bataille uma vez escreveu: "A literatura é o impossível".

Roland Barthes afirmou: "O texto é o insustentável".

Maurice Blanchot publicou: "Escrever é o interminável".

Pascal Quignard, mais recentemente, ingressou nesta conversa: "A literatura está vinculada ao irreconhecimento".


Tendo estas quatro frases ricocheteado em mim durante os meses em que escrevi um livro, diria que agora tento continuar o caminho das conversas iniciadas pelos autores que me antecederam para incluir aí o eco do que estas leituras, e que o próprio gesto de escrita produziu em mim. Na próxima 4ª feira, 7 de outubro, com imensa satisfação conversarei com a Patrizia Corsetto sobre as relações entre a escrita e aquele que escreve. Abaixo, alguns dos pedaços esboçados em um caderno nos últimos tempos, sobre o gesto de escrever:


  • Escrever para (jamais) encontrar o nome que falta, aquele que nomearia nosso oco, nosso impasse, nossa divisão, nosso desencontro, nossa ferida.
  • A escrita é feita por aquele que lê.
  • Descobrir que escrever nos revela diferentes a nós mesmos. Que podemos ler o próprio texto com o estranhamento de quem encontra algo pela primeira vez. Que escrever pode ser também um fogo que arde e que só quer fazer sua chama perseverar, passando-a ao leitor ou passando-a a um novo texto. A escrita carrega, ainda que o renegue, o poder do contágio.
  • Manter no horizonte estas quatro condições da escrita - o impossível, o insustentável, o interminável, o irreconhecimento. 
  • A escrita teria uma finalidade privilegiada, exclusiva? Que função a escrita pode desempenhar para aquele que escreve? Uma análise faz escrever? O que poderia operar como causa da escrita? É possível prescindir de um interlocutor quando se escreve? Aceitaríamos a distinção proposta - inicialmente por Barthes - entre escrita e escritura? 
  • Conviria desarticular um pouco a relação entre escrita e cura ou a escrita como sublimação. A escrita é também violência, destruição, devastação, aniquilamento. Tão cortante quanto um estilete. 
  • A escrita desloca aquele que escreve.
  • Escrever para ler o desenho que se sulca, suavemente, aquilo que falta à linguagem e reencontrar depois, com surpresa, e talvez com alegria, o traço que poderemos ler como nosso, fazendo dele um pedaço digno. 
  • Escrever: chamar o outro, amaldiçoar o outro, reclamar ao outro, privar o outro, rivalizar com o outro, consistir o outro, assassinar um outro, denunciar o outro, cortar, ensaiar um laço, inventar um outro, amar um outro, testemunhar, homenagear, apagar, enganar, enganar-se, perder-se, gastar-se, estranhar-se, imitar o outro, tornar-se outro, fazer-se outro, s'outrar-se, outrificar-se, outralizar-se, outrosser. 
  • Escrever para silenciar, para esperar, para contornar o lugar onde nenhuma palavra chega. Sem por quê. Porque sim. Escrever para ler. E se vier a ler, já virou outro.
  • Parafraseando Freud: a escrita, como uma análise, é magia lenta.