Aqui, com Duras

25/08/2020

Estou aqui com a senhora Duras, ora uma velha abstêmia, ora uma alcóolatra devastada, ora uma criança de 8 anos brincando na selva quente do Vietnã, ora uma jovem à espera do marido preso em um campo de concentração, ora uma escritora entediada em um coquetel social, ora alguém que bate em uma porta que jamais lhe responderá. Algumas histórias se acrescentam ao longo das décadas, mas há uma dureza exuberante que recolho de sua palavra sempre que a encontro. 

Duras faz o elogio do arrebatar-se, do consentir em ser levado para fora de si, em direção ao outro, do manter-se em movimento e, ao mesmo tempo, de cultivar com coragem o silêncio, a solidão, a lentidão e a separação do outro. Entre a pobreza, os buracos, a incoerência, o álcool, os homens, a infância sem fim, uma frase passa:

"O desejo é um movimento em direção ao outro. É uma apreensão do outro. São movimentos em direção a, movimentos que te levam para fora de si, que te deixam fora de você. Fiz meus livros com os outros. O que não deixa de ser um pouco estranho é essa transformação que isso talvez sofra, o som que produz ao passar por mim, nada mais. É um som que isso produz ao passar por uma determinada pessoa"

Leio: um livro é um som produzido quando o outro me atravessa em meu silêncio.